Depois de um ano que mostrou para todos o quanto as coisas são imprevisíveis, é hora de nos prepararmos para um 2021 que promete ser um ano de alta complexidade. Por isso convidamos o arquiteto e designer Marko Brajovic, pesquisador de biomimética, estudos comportamentais e fenomenológicos, para ajudar na ousada tarefa de mapear as principais tendências de comportamento para o próximo ano.
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As 7 Previsões Imprevisíveis para 2021 com Marko Brajovic
transcrição
Marko Brajovic: Acho que o futuro vai se desenhar para o ser humano e desenhar para todas as espécies. Que a gente, de novo, não vai sobreviver sozinhos nesse planeta. Ou todos sobrevivem, no ecossistema, ou ninguém sobrevive.
Lucas Mello: O convidado de hoje é o croata Marko Brajovic, arquiteto, designer e curador formado na Universidade de Veneza e com pós graduação em Arquitetura bio digital em Barcelona. Com projetos assinados em mais de 10 países, ele já recebeu prêmios internacionais, como a EFE Gold e o World Architecture Festival.
Marko Brajovic: Acho que está ficando cultural, pouco a pouco, você não quer mais participar de forma linear de consumo. Você não quer mais ser o consumidor. E eu te falo, amigo, que quando alguém me chama o consumidor, é muito ofensivo. Eu acho que é chamar alguém de consumidor é muito ofensivo.
Lucas Mello: Marko é fundador e diretor criativo do ateliê que leva seu nome e, hoje, está focado na pesquisa de novos formatos de viver, trabalhar e na coexistência dos humanos integrados com a natureza, através da biomédica, estudos comportamentais e fenomenológicos.
Lucas Mello: Depois de um ano que mostrou para todos o quanto as coisas são imprevisíveis, é hora de nos prepararmos para um 2021, que promete ser um ano de alta complexidade. Prever tendências dentro desse contexto chega a ser uma loucura. Por isso, convidei meu grande amigo e visionário para o desafio desse episódio, mapear as principais tendências de comportamento para 2021.
Lucas Mello: Eu sou o Lucas Mello. CEO e CCO da Live, agência pós digital e vou te levar para mais um episódio do 22 mil pés. Vamos lá, então?
Lucas Mello: Markito, seja muito bem-vindo ao 22 mil pés. É uma alegria enorme gravar esse episódio com você meu amigo.
Marko: É recíproco, Lucas.
Lucas Mello: Bom, desde o início do isolamento social a gente teve o privilégio de estarmos vivendo juntos na nossa comunidade no meio da Mata Atlântica, na região de Parati. E essa experiência já nos proporcionou várias conversas maravilhosas sobre tudo o que a gente está vivendo hoje no planeta. Arrisco a dizer que 2021 vai ser um dos anos mais imprevisíveis do século. E que bom que a gente pode estar aqui hoje especulando sobre o futuro.
Lucas Mello: A primeira previsão imprevisível, a gente está chamando aqui “da força das novas tribos” e, se tem uma coisa que 2020 nos trouxe, foi a consciência de quem são os nossos melhores amigos e as pessoas com quem a gente quer estar próximo. Com todas as limitações de socialização que a gente tinha esse ano, a gente se viu obrigado a selecionar os grupos de amigos e relacionamentos. E esse pequeno círculo de amigos, diria até dez pessoas, tem uma palavra muito forte em comum que é a confiança. E nessa nossa sociedade cheia de filtros, fake news, harmonização facial, a confiança vale muito. E em 2021 eu acredito que a gente vai ver esses pequenos grupos ainda mais fortalecidos. Se reunindo muito ainda nas casas das pessoas e até viajando juntos, quando possível. Então, o que eu digo é que o que 2021 uniu, ninguém mais separa. Esse é o comportamento muito comum até em outras espécies de animais, né? E eu estava pensando, será que a gente pode dizer que essas bolhas sociais que a gente criou, são parte desse nosso instinto animal? Que cê acha?
Marko Brajovic: Acho interessante esse ponto, Lucas, porque ainda mais você relacionando isso a uma questão instintiva, porque de fato está volta ao ancestral, as relações ancestrais, ela é fundamental num momento no qual as relações foram construídas, muito, sobre uma troca mercantil.
Marko Brajovic: De fato, as relações humanas, no entanto, com quem você trabalha, com quem você se relaciona no dia a dia, né? A nível quantitativo, também no nível qualitativo. Relações de interesse comum, relações de interesse comum em cima de produtos, de life style. Tudo isso, nos tirou de uma relação mais primordial e primitiva entre seres humanos. E tirou a gente da relação como a interconexão de confiança, como estratégia de sobrevivência. Falando de outras espécies, eventualmente, a confiança é um dos elementos fundamentais de sobrevivência como coletivo. Essa visão individualista, na qual a espécie humana chegou e por relações só de intercâmbio mercantil, de interesses, né? De débito e crédito entre as pessoas, nos colocam na posição de esquecer que as relações mais fortes de convivência e de confiança, são os mutualismos, que é a base da natureza, né? Foi, de alguma forma, manipulada a informação darwiana de que o mais forte sobrevive, o mais adaptável. Sozinho, sobrevive, né? A lei da selva. Quando se fala “a lei da selva”, até como metáfora, totalmente errada, né?
Lucas Mello: Sim, parece uma coisa ruim né? Quando fala isso “a lei da selva”. Vira uma coisa pejorativa, né?
Marko Brajovic: Pejorativa, né? Porque tem esse imaginário coletivo que nos foi construído, como uma espécie competitiva de sempre termos que ser o mais forte para sobreviver. E a gente, hoje os estudos mais recentes da biologia definem, totalmente, que em pouquíssimos casos, o mais fortes sobrevive. Quem sobrevive é quem colabora. Quem se interconecta, quem tem confiança um no outro. A simbiose, né? Vários tipos de cooperações na natureza são muito mais fortes
Marko Brajovic: A parte mais exuberante da natureza é a colaboração. É a parte do mutualismo, é a parte da cooperação, onde grupos se organizam entre si em sistemas, em ecossistemas, em biomas. E isso que mantém, faz a manutenção da vida, né? Cria as condições para vida. É a vida que cria condições para a vida. E estas novas tribos, é uma questão de sobrevivência. Quando se pede uma sobrevivência? Quando estamos em crise. Estamos em uma crise de saúde e, consequentemente, as pessoas se organizam, de forma instintiva, nos componentes mais essenciais, mais puros e mais primordiais da confiança. Acho que é um maravilhoso começo, né? Que vai evoluir e se escalar em estruturas mais complexas de relacionamentos. Mas este mínimo componente de confiança é fundamental para ser resgatada e isso está acontecendo.
Lucas Mello: É, esse aspecto da confiança é muito importante para a nossa sociedade, nesse momento, né? A gente está que no momento, talvez, de mais desconfiança da nossa história recente. Uma coisa que eu acho interessante, também, como as empresas, a maior parte das grandes empresas, certamente, não vão obrigar seus funcionários de escritório a trabalharem de forma presencial, de novo. Eu acho que vai começar, gradualmente, um formato híbrido, etc.
Lucas Mello: Mas, tem um deslocamento do eixo social, que para muitos de nós girava no entorno dos colegas de trabalho, para um convívio mais intenso com pessoas mais próximas, como familiares, vizinhos, amigos, a comunidade mais próxima. Essa comunidade de confiança. E essa é uma mudança muito significativa, porque ela muda também o papel do trabalho na vida de milhões de pessoas. Então, acho bem interessante essa mudança de eixo da vida e o quanto que ela joga a gente para dentro da nossa comunidade mais próxima. Que muitas vezes a gente estava desconectado, por que passar tanto tempo dentro de um escritório, tanto tempo convivendo com colegas de trabalho, etc. Só com colegas de trabalho.
Lucas Mello: Eu queria passar já para a nossa próxima previsão imprevisível, que tem uma correlação bem forte com essa primeira. Mas, eu acho que ela tirar ainda mais proveito da tecnologia e eu estou chamando-a de Global Village. Quando a gente olha, por exemplo, para países como os Estados Unidos e França, cerca de 30 por cento da população desses grandes centros urbanos, dizem que tem vontade de morar no campo. No Brasil, de acordo com essa mesma pesquisa que, se não me engano é da Global Web Index, esse número é de 16 por cento, que considero, ainda, um número bem alto, né? E essa primeira crise sanitária e econômica que a civilização vive, dentro de um mundo onde a internet banda larga está acessível para uma parcela enorme da população mundial.
Lucas Mello: Hoje são quase cinco bilhões de pessoas, no mundo, que têm acesso à internet. Esse número cresceu 1.200 por cento desde os anos 2000. Então, esse movimento teve diz menos sobre um esvaziamento das cidades, mas ele é mais sobre uma desconexão definitiva para muitas pessoas entre o local de trabalho e local de residência. Em alguns países como Barbados, por exemplo, lançaram vistos especiais para trabalhadores remotos que queiram morar lá. O Havaí também lançou um programa semelhante. Isso altera muito a forma como os talentos e o capital, também, circulam pelo Globo. Eu acredito que 2021 vai ser o ano em que a gente vai ver muito essa tendência se estabelecendo. E Não se trata de um nomadismo digital, que é um conceito que que já existe há um tempo, que é as pessoas se deslocando ou quase como nômades pelo Globo. Acho que isso vai, com certeza, aumentar também. Mas é de, realmente, estabelecer uma nova configuração, no nível geográfico, entre trabalho e vida. Qual que é o impacto que você acha que isso pode trazer para a civilização como um todo?
Marko Brajovic: Parece uma grande, de novo, evolução comportamental da nossa espécie, de uma espécie nômade, né? Até a invenção da agricultura, né? De uns 15 mil anos atrás para uma sociedade sedentária e, consequentemente, a construção do conceito de civilização. E isso, curiosamente, acontece sempre nas crises. Basicamente, nas crises climáticas, né? Considerando que a crise que estamos vendo hoje em dia, é uma crise inerentemente sistêmica. Que interage diretamente com a crise climática. Esta transformação do nosso modus vivendi, modus operandi nas relações da primeira pergunta, e no jeito que a gente se estrutura, o nosso trabalho, o nosso viver na era digital, ela traz esta previsão já antecipada nos anos 60 por Marshall McLuhan pouco, né? Da questão do Global Village né? O que é isso traz na descentralização e criação de uma malha de interações. Tanto urbanas, logísticas, operacionais, metabólicas, energéticas e produtivas. Vendo uma visão do globo, esférica. Traz essa terceira dimensão e, depois, acho que é a quarta dimensão fundamental do tempo nisso, numa visão mais geométrica, né? Eu vejo isto de uma forma muito geométrica.
Marko Brajovic: Um globo, interconectado, descentralizado, distribuído. O Global Village, ele garante, absolutamente, a maximização dos desacordos em todos os pontos, né?
Marko Brajovic: Ele tem que garantir a diversidade do sistema, não ficar um sistema homólogo. E acho que isto vai funcionar no momento que a gente sai, também, de sistemas fechados. Necessariamente, como as cidades que é um sistema fechado, nos próprios feedbacks loops, assim, em todos os sentidos. E começa a expandir esse sistema num território maior, onde começamos, também, a ter consciência de onde vêm as coisas, de onde vêm as coisas, né? Quando a gente sai e convivem num sistema mais difuso ou fora das grandes cidades, a gente também começa a entender onde vão os resíduos, como são tratados, trazidos, de onde vem o alimento. Começa a fazer parte deste metabolismo global, saindo de um sistema fechado da cidade. Onde você só recebe e consome os produtos, sem ter a consciência clara como isso funciona na visão global. Acho que esta percepção, global, que a gente tem através da Internet; a nível conceitual e achando que estamos interconectados, todos, através das mídias, no momento que você também tem o deslocamento físico e você começa a mapear a parte logística, digital, operacional com a parte física. Você começa a ter uma visão muito mais integrada do planeta Terra, como sistema vivo. De novo, acho que é o digital, sendo muito mais próximo ao metabolismo biológico da biosfera.
Lucas Mello: Achei bem interessante essa questão da conexão, ela materializa a diversidade que a gente tem no planeta. E isso pode trazer mais resiliência para o sistema, né? Como um todo.
Lucas Mello: E é interessante quando a gente olha as mudanças climáticas, né? Que, certamente, vão forçar, nos próximos anos, a uma mobilidade ainda maior no Globo. De pessoas se deslocando, tendo que sair de regiões que estão sendo afetadas, que vão ser afetadas e já estão sendo afetadas pelas mudanças climáticas. E essa é quase como se a gente tivesse vivendo, hoje, o início dessa era, que eu acho que vais ser uma área de muita mobilidade no globo, né?
Marko Brajovic: Sim. Eu acho que vai ter um nomadismo, nas grandes migrações, mas elas, claramente, impulsionadas pelos mesmos fenômenos naturais, ou parecidos fenômenos. Claro que o número de seres humanos e isto traz pandemia, traz outro tipo de vetores que não existia no passado, eventualmente. Mas, também, por uma certa liberdade, né? Desta relação entre trabalho e vida. Essa também traz um novo nomadismo, que às vezes transcende na necessidade direta, mas vai na busca de uma qualidade de vida, na procura do próprio tempo, né? E do próprio espaço, fora dos sistemas produtivos industriais e lineares de consumo, que até hoje em dia dominavam tanto as relações, quanto o nosso tempo, o quanto nossa arquitetura, quanto ao nosso modo de viver. Acho que a percepção, agora, é muito mais clara que esse sistema está em colapso, né? Esse sistema fechado produtivo está em colapso. E as pessoas estão procurando pouco espaço, próprio tempo. E isso, justamente, traz um novo momento de se encontrar neste território do planeta Terra.
Lucas Mello: Eu acho que isso é bom já faz uma conexão interessante com a essa próxima previsão imprevisível para 2021, que a gente está chamando a arquitetura do tempo e espaço. Que 2020 foi um ano muito agitado no mercado imobiliário, por incrível que pareça. Por um lado, muitas pessoas procurando mudar para espaços maiores, que pudessem acomodar essa nova dinâmica de home office, home scholing, longos períodos dentro de casa, enfim, muita gente se deu conta, também, que não morava dentro de um lugar que era minimamente saudável para um estilo de vida, enfim, para esse nosso novo estilo de vida. Por outro lado, também, pessoas com muitas dificuldades financeiras, procurando reduzir custos, mudando para o espaço menores, apartamentos menores. Seja como for, as moradias, elas ganharam um protagonismo. Talvez o maior protagonismo da década na vida de todos nós.
Lucas Mello: Como se as nossas casas fossem hardware, que agora precisa rodar vários softwares diferentes da nossa vida, né? O trabalho, o lazer, o estudo, a alimentação, a meditação, a prática de esportes, enfim, tudo isso. O espaço que ele precisa comportar, nosso hardware, ele precisa ter uma capacidade maior e precisa ter essa versatilidade. Então, 2021 promete dar continuidade para esse movimento, acho que vai ser ainda mais forte. Tem vários empreendimentos imobiliários, muitos deles horríveis por sinal, arriscando novas propostas de uso de espaços. Acho que a varanda gourmet mudou para o home office, mudou o conceito imobiliário, o produto imobiliário deu uma pequena mudança. O mercado de construção e reformas também muito aquecido. Enfim, como você acha que essas casas daqui para frente? Que que vai mudar na forma como as pessoas vivem nos seus espaços?
Marko Brajovic: Essa é uma boa pergunta. Acho está muito relacionado ao Global Village, porque a grande percepção, acho, que está acontecendo, ainda mais acelerado agora na pandemia, que é esta separação entre ambientes, né? Típica de um projeto tradicional, assim, no sentido tradicional mesmo, ou industrial. Essas duas palavras se juntaram bastante. Numa visão de separação, separatista do teu espaço.
Marko Brajovic: Que o modo de viver, onde você tem um quarto, uma sala, um espaço de trabalho ou um espaço social, para receber as pessoas, um espaço de onde você se limpa, um espaço onde você se alimenta. Essa divisão das nossas funções, muito característica de uma visão fragmentada e linear, industrial, né?
Marko Brajovic: Está sendo, totalmente, considerado obsoleto. Particularmente, as novas gerações, fizemos vários tipos de pesquisas internas e de grupos criativos no ateliê, né? Principalmente com jovens arquitetos, que trabalham com a gente. E está claríssimo que as pessoas estão entendendo a casa, o conceito de casa, como uma extensão do próprio corpo. Mais que como espaços fragmentados onde ela tem que cumprir tarefas. Isso é muito forte, porque você começa a entender que para ter um espaço social, se você não pode ter um relacionamento social. Para ter um espaço, uma sala, um quarto vazio? E isso você só consegue perceber quando você passa o dia dentro na casa. E a esta questão do tempo, na arquitetura, é mais importante que nunca, porque antes estava sob pressão do espaço, não estávamos pensando no tempo. O que era um espaço, um apartamento, por exemplo, de 100 m² você vivia, no teu quarto de 20 metros quadrados, aproximadamente, você passava, eventualmente, oito horas. Na sala, passava quarto, cinco horas. No banheiro, passava duas horas. Na cozinha, passava duas, três horas. E você sempre vivia o espaço de forma fragmentada. Se você pega o relógio e divide o tempo, você ganha uma percepção temporal fragmentada da tua arquitetura.
Marko Brajovic: Os mesmos espaços viraram espaços de ioga, de exercícios. O cuidado do corpo não é só um cuidado, eventualmente, de higiene, estético no banheiro. Mas o cuidado em todo o seu sentido, o que você come, como você se relaciona a você mesmo e, de alguma forma, as pessoas ficaram muito se curando por elas mesmas na alimentação e no modo da qualidade de viver.
Lucas Mello: É muito interessante, quando a gente olha o que aconteceu muito na cultura americana, né? Que as pessoas foram entulhando, pessoas com casas grandes, com uma metragem grande, entulhando de eletrodomésticos inúteis. E aí, isso deu origem para um mercado gigante, que é o mercado de Self Stores, né? Que são aqueles galpões que você consegue botar as coisas nos galpões.
Lucas Mello: Por mais que a pessoa tem espaço, esses hábitos de consumo acabam, também, consumindo tempo e espaço das pessoas. É legal a gente poder pensar que o espaço para ser versátil, ele precisa poder caber o tempo dentro, os tempos todos dentro.
Marko Brajovic: Todos os tempos no mesmo espaço. Essa tua terceira pergunta se conecta as primeiras duas também né? Acho que isso vai criar, totalmente, uma nova área de espaço de conviver. Que não são nem configurações familiares, não são repúblicas, não são configurações de convivência, de compartilhamento só de espaços de lazer, mas são, realmente, eventualmente, futuras pequenas tribos compartilhando o próprio conceito de casa.
Lucas Mello: Interessante falando, ainda, sobre essa intersecção entre o físico e o virtual, essa integração entre o físico e virtual. A gente chega na nossa próxima previsão imprevisível para 2021, que é o boom dos eventos híbridos. Depois do COVI-19 praticamente desligar a indústria dos eventos físicos em 2020, à medida que as vacinações comecem a chegar, de uma forma mais ampla na população, a gente espera que isso não leve o ano inteiro. A gente espera que as nossas autoridades, ou as nossas desautoridades ajudem, veremos um retorno gradual desses eventos presenciais, naturalmente. Só que esse ano mostrou uma grande potência dos eventos virtuais. Para se ter uma ideia, segundo uma pesquisa do Grand View Research, o tamanho do mercado de eventos virtuais, esse ano, foi de quase 78 bi de dólares e deve, até 2030, crescer passando de 700 bilhões. Então, para 2021, eu acredito que a gente vai ver um crescimento brutal no número, na quantidade e na qualidade dos eventos virtuais. Só que eu acredito que, na medida que a gente conseguir combater a pandemia, nós vamos ver um tipo de evento chamado de evento híbrido, que é um evento onde a gente vai ter por um lado experiências super exclusivas, transformativas e imersivas por um grupo reduzido de participantes. Mas, ao mesmo tempo, um alcance brutalmente inclusivo desses conteúdos, desses eventos, para todas as pessoas que não conseguem estar presentes num evento. Eu sei que o ateliê já fez grandes eventos, exposições, bienais e feiras etc. Como o ateliê está se preparando para 2021, dentro desse tema dos eventos?
Marko Brajovic: De um lado, a gente está na parte de desenvolvimento, né? A gente está desenvolvendo já há uns seis meses, em colaboração com empresas de programação de games, estamos desenvolvendo umas plataformas virtuais, para exposições em 3D, em tempo real, com software de games. Mas, acho que a evolução vai ser o mapeamento da transposição virtual de uma exposição navegável, para uma plataforma híbrida de realidade aumentada. Mas, será que a gente não consegue avançar mais em cima disso? Porque essa tecnologia já existe dos anos 90, isso é curioso, né? Tanto nós, quanto, achamos, muitos outros grupos e escritórios estão resgatando tecnologias, que quando a gente olha para elas, ok, existiu já em 2000, 2005. Era muito em uma esfera geeks, era muito relacionada nos games. Hoje, você traz isso para o público em geral e vira uma plataforma super mais acessível. Agora, a nível de comportamento, será isso mesmo? Será que a pessoa, realmente, vai querer ficar tantas horas em cima de uma plataforma digital?
Lucas Mello: Isso é muito bom. Assim, eu sempre penso sobre, existe um nível de processamento de conhecimento, que ele só se dá através da experiência. Só se dá quando você projeta o seu corpo em algum espaço, né? E tem um nível de processamento de informação que é corporal, assim, não é mental simplesmente. Então, é interessante imaginar que o deslocamento, a movimentação pode ser um evento, né? Não, necessariamente, é ficar parado. Porque também tem isso, né? Você ficar parado na frente do computador ou ficar parado num auditório, tem pouquíssima diferença. Agora, se você viveu a experiência. Projetar o seu corpo dentro de uma movimentação, que é diferente, te ajuda a processar o conteúdo e o conhecimento de um outro jeito.
Marko Brajovic: É, você falou, estar em um auditório ou estar com uma tela em frente, de qualquer formato, tem realmente limitações, sobretudo de linguagem.
Lucas Mello: É, e quando a gente fala de eventos virtuais, não tem como não pensar enquanto todos estamos cansados das telas. E é sobre isso a próxima previsão imprevisível para 2021, que a gente está chamando da explosão do áudio. Que o nosso consumo de telas ele cresceu, absurdamente, em 2020. Tão absurdamente que esse termo fadiga de zoom foi criado, dos longos calls de trabalho, passando pela chuva de lives que viveram em determinado momento. Nesse ano, a gente passou de todos os limites de tempo de tela que possam ser, minimamente, razoáveis assim. Uma pesquisa da Nielsen falou que a gente chegou numa média de 13 horas de telas por dia, durante a pandemia. Dá mais ou menos umas 3 horas sem telas durante o dia, porque o resto a gente está dormindo. Então, é um negócio brutal mesmo. Então eu acredito que 2021, a gente vai presenciar um forte crescimento da voz, como meio de aprendizagem, entretenimento, experiência e socialização. Seja através do crescimento dos podcast. Seja na hora de trocar aquela reunião de vídeo por um bom e velho telefonema. Eu coloco muitas das minhas fichas no áudio para o ano que vem. E, uma das minhas apostas, é o surgimento, inclusive, de eventos virtuais só de áudio. Criar uma experiência auditiva, você pode juntar ela com uma experiência sensorial descentralizada. A pessoa pode estar fazendo outro tipo de algum tipo de movimentação, frequentando algum tipo de espaço, e estar presente num evento. Sem estar fisicamente e sem estar na frente de uma tela. Você que é um grande apreciador de áudio books, como você vê essa previsão imprevisível? O que você enxerga disso?
Marko Brajovic: A parte do audio book, um tema, assim, bastante empírico que me aconteceu, decidindo de ir a pé para o escritório em São Paulo. E estas caminhadas de meia hora, 45 minutos, com áudio book. E em um certo momento, comecei, para lembrar dos livros ou das partes de um livro específico, acontecia, na minha cabeça, imagens da rua na qual estava ouvindo esse trecho. E me fez pensar muito, porque comecei a ter uma relação sinestésica direta entre a narrativa, com o urbanismo da cidade. Exatamente o trecho do livro quando eu subia na tua rua, lá em frente à casa, na Caiowa, naquela subida, eu lembro do trecho de livro. E essa marcação é muito interessante, porque não marca a nível cognitivo, marca a nível fisiológico, me marcou pelo corpo. Sabe, se você começa indo para o áudio, acho que você começa a resgatar a memória do corpo. Se você começa a sentir e lembrar pelo corpo.
Marko Brajovic:Acho que todos nossos sentidos ser resgatados como ao nível de linguagem, a nível de sistema, é uma riqueza fundamental. Para mostrar adaptação e para nossa evolução, como espécie. Quando falamos de evolução, falamos que estamos em uma crise climática e cada crise climática é uma chance de evolução da nossa espécie. Acho que é resgatar esses sentidos é fundamental. E o áudio, para mim, me fez lembrar a importância da memória corporal. Por exemplo, você falou “posso ouvir um áudio, podcasts e posso dirigir, posso estar no outro ambiente”, você consegue transformar o ordinário em extraordinário através do som. A gente sabe isso só ouvindo música nos lugares, específico, na nossa vida. Agora, ouvir conteúdo ou memorizar conteúdo é um novo território. É um território ancestral de transmissão de conhecimento oral. Até a emissão da escritura tudo era transmitida oralmente. Uma vez se falava, em torno da fogueira, um conto e esse conto ficava memorizado em dez pessoas, que espalhavam para outras dez pessoas. A transmissão da informação oral.
Lucas Mello: Eu acho que a gente acabou migrando de uma sociedade extremamente auditiva, para uma sociedade extremamente visual. Que eu que é o momento que a gente está vivendo hoje. Onde tudo é estímulo visual. Onde as redes sociais, onde tem essa valorização extrema, também, pela estética, que chega a um ponto doentio assim.
Lucas Mello: E aí quando a gente consegue trabalhar em um outro sentido, a gente abre um portal enorme de evolução, na minha opinião. Eu acho que isso é muito potente e eu acredito muito que a gente vai ver isso cada vez mais forte daqui para frente.
Lucas Mello: A gente chega, agora, na nossa sexta e penúltima previsão imprevisível para 2021, que tem a ver com várias coisas que a gente já falou, que a força da compra consciente. Nesse ano, nós vimos muitos movimentos, muito fortes de incentivo à compra de produtos de pequenos comerciantes, marcas independentes, produtores locais que precisavam desse suporte. De gente apoiando o seu restaurante preferido, seu boteco preferido. Eu acho que a pandemia materializou a potência que é a escolha de compra de um produto em detrimento de outro. Apoiar uma empresa em detrimento de outra. Uma pesquisa feita pela IBM, uma pesquisa global, são 28 países que eles pesquisaram, mostra que seis em cada dez consumidores estão dispostos a mudar seus hábitos de compra para reduzir o impacto ambiental.
Lucas Mello: Então, esse é um número recorde, nunca tinham chegado nesse indicador. E para os consumidores que consideram a sustentabilidade como algo importante, mais de 70 por cento se dizem dispostos a pagar até 35 por cento a mais por essas marcas e produtos mais sustentáveis. Então essas marcas que defendem, genuinamente, justiça racial, justiça climática, elas começam, aos poucos, a se estabelecerem com força diante das gigantes multinacionais. Que a gente sabe que tem cadeias de produção remotas, com práticas muitas vezes até questionáveis e isso é um pouco do que a gente falou antes, se não tem visibilidade de onde é feito, né? Você não consegue entender o produto, ele simplesmente se materializa na prateleira; versus um produtor local, uma marca independente que você sabe quem está fazendo, de onde vem. Então 2021, eu acredito que comprar vai ser cada vez mais um ato consciente e político. Como que você acredita que isso vai impactar as nossas vidas? E também, eventualmente, impactar positivamente os briefings que o ateliê recebe, né? De trabalhos para marcas e até de casas também, né? Fala um pouco desse processo de construções mais sustentáveis, materiais etc. Como é que você enxerga isso?
Marko Brajovic: Começando pelo ateliê, nossos projetos residenciais e comerciais, ou eventos de ativação de marcas, as pessoas que se aproximam, eles já vêm com esta procura. Acho que um pouco o que você acredita e como você se posiciona, você atrai um tipo de visões de clientes que estão em uma redefinição e que estão, claramente, entendendo que promover o consumo infinito num planeta finito é, obviamente, obsceno.
Marko Brajovic: Quem ainda consegue fechar os olhos em cima desta situação e são muitos que ainda conseguem fechar os olhos. Agora, tanto as marcas quanto os usuários, viraram uma relação muito mais visceral, muito mais integrada no futuro. Não é mais uma divisão de compra de um produto que você não sabe onde vem, como vem. Nesse sentido, está abrindo totalmente o seu processo, o próprio jogo. Mostrando o próprio metabolismo, em todas as todas as esferas. Para se oferecer, os próprios erros e as próprias vitórias, para serem compartilhadas com mais um bem comum, como bem singular puramente lucrativo. E tem outras, ainda, né? Business as usual que estão reticentes. No nosso caso, a gente não tem contato direto ou, quando tem contato direto dessas empresas, elas vêm por uns departamentos de inovação, que estão lá e a gente acha que faz parte do nosso trabalho, também, ajudar nesse movimento.
Marko Brajovic: Sobre a participação do público na aquisição, basicamente, dos produtos e, eventualmente, na manutenção, fica sendo uma relação muito mais íntima. Você começa a se relacionar de forma mais próxima ao produto, ele começa a ficar no dia a dia. Ainda mais se você entende de onde ele vem, como ele foi feito, onde ele vai e você fica sendo partícipe de alguma forma do nascimento do objeto. É fundamental e essencial para todos fazermos parte desse entendimento sistêmico da produção e, consequentemente, do consumo não ser um consumo. Esta palavra também traz um fato que você consome algo, ele não tem mais nenhum tipo de utilidade, ele pode ser jogado. Na natureza não existe essa palavra de lixo, né? Não existe o conceito de lixo. Você não tem consumo. Você tem transformação através do processo, de uma energia, de componentes químicos que se vão transformando e adaptando a novos usos, a novas funções e vai fluindo dentro do sistema. Agora, esta visão dead end, que um produto nasce do nada e vai para o nada. Só está sendo uma visão sistêmica, voltado para as primeiras perguntas, a evolução da espécie entendendo de forma sistêmica o nosso planeta, a biosfera, o metabolismo do nosso planeta. Entende que esses produtos já não vêm de um lugar e é obsceno, o uso, a promoção desse tipo de processos lineares, dead end. É obsceno o uso desses processos. Acho que está ficando cultural, pouco a pouco, você não quer mais participar de forma linear de consumo. Você não quer mais ser o consumidor. E eu te falo, amigo, que quando alguém me chama o consumidor, é muito ofensivo. Eu acho que é chamar alguém de consumidor é muito ofensivo.
Marko Brajovic: Se você entende o metabolismo e, esse é um fato de aprendizado, para as empresas que está consciente que está abrindo o jogo e mostrando como é o sistema. Não são sistemas perfeitos, não são. Não existe, no mundo, e ainda não temos. Ainda mais a origem industrial e do capital, que temos um sistema perfeitamente regenerativo, mas a tendência da gente entender que os processos têm que ir no caminho regenerativo e envolver os usuários, o público, o cidadão, o ser humano dentro nesse processo regenerativo, de ele entender que ele faz parte disso e ele pode ajudar a levar o processo regenerativo é fundamental. Isso transcende qualquer visão do mercado.
Marko Brajovic: Outra palavra totalmente abstrata e inútil. Acho que é para quem você desenha, para o mercado, acho que a gente desenha para o ser humano. Começar a desenhar para o ser humano, e não só para ser humano. Acho que o futuro vai se desenhar para o ser humano e desenhar para todas as espécies. Que a gente, de novo, não vai sobreviver sozinhos nesse planeta. Ou todos sobrevivem, no ecossistema, ou ninguém sobrevive. Acho que, para mim, o consumo consciente é mais você entrar e entender o ciclo metabólico e tentar fazer parte de um processo regenerativo em qualquer movimento que você faz e vamos evoluindo os sistemas.
Lucas Mello: Esses dias, até te contei que eu fui em uma cafeteria, que eu gosto bastante em Parati e comprei um café ali, local e tal. E aí, eu estava pagando o café, o atendente falou “você gostaria de uma sacolinha de plástico, para ajudar poluir os oceanos?” Eu achei extremamente agressivo e simpático, ao mesmo tempo.
Marko Brajovic: A nossa postura, Lucas, acho que tem que ser radical. E você falou que é um ato político, é um ato político. Não comer carne, é um ato político. Que é um ato político muito forte, que desmonta todo um sistema, em grande parte, perverso, abusivo e destrutivo, potencializador da crise climática. Qualquer consumo que a gente faz, o estilo tradicional de consumir, à parte de um ciclo, a gente está contribuindo ou não contribuindo, estamos direcionando a civilização, a espécie humana.
Lucas Mello: E chegando na nossa última tendência e previsão imprevisível para 2021, ela é, infelizmente, a mais previsível de todas, que é a busca pela saúde mental. Então, todo o estresse, as dificuldades financeiras, problemas de saúde, essa alta exposição às telas que a gente já falou, elas estão, infelizmente, levando a humanidade a adoecer de ansiedade e depressão. Então, uma em cada quatro pessoas no planeta são, ou vão ser afetadas, por algum tipo de doença mental ao longo da sua vida. E as mulheres têm o dobro de chances de serem afetadas do que os homens. Um dado alarmante e brutal, assim, né? Que mostra, também, questões estruturais de machismo na sociedade, etc. E para piorar, dois terços das pessoas com problemas de saúde mental não recebem e jamais vão receber o tratamento que precisam. Então, em 2020 a gente viu, por exemplo, o movimento da tele terapia se consolidando, com muitas pessoas migrando ou iniciando tratamentos psicológicos pela internet. Isso dá mais acesso a profissionais, dá mais facilidade, principalmente, para a geração Z, que é, justamente, a geração mais afetada pelos efeitos negativos da tecnologia, psicologicamente falando, mas, também, se sente muito mais confortável de fazer esse tipo de tratamento virtual. Esse movimento deve crescer muito em 2021. Eu acho que tem, de certa forma, um movimento de inclusão, né? Na terapia, etc e pessoas também falando mais abertamente sobre isso. Que, ainda, por incrível que pareça, é um tabu, em pleno 2020. Outro ponto importante, também, foi a valorização, está sendo a valorização dos tratamentos alternativos, das medicinas da natureza, do uso de psicodélicos também que se fortaleceram muito esse ano. Até do ponto de vista mercadológico. Tem uma indústria inteira nascendo em cima disso, principalmente no Canadá. E a minha previsão imprevisível é que 2021 vai ser o ano em que muitas pessoas vão buscar ajuda e cura, também, fora dessa medicina tradicional que a gente sabe que tem uma série de limitações e que, muitas vezes, não tem as respostas que a gente precisa pra, principalmente, para esses tratamentos psicológicos e psiquiátricos. Eu queria muito encerrar essa última tendência ouvindo a tal visão sobre a relação entre os humanos e a natureza, que eu sei que é uma das tuas áreas de estudo e o quanto essa reconexão pode trazer impacto para esse tema da saúde mental, que é urgente e emergente.
Marko Brajovic: Esse tema é bem grande e bem maravilhoso. Espero poder contribuir com os meus pontos, assim, para abrir umas perguntas, mais que dar algumas respostas. Que estamos, todos, na procura dessas respostas, mas umas perguntas que estou pesquisando bastante e sobre este conceito da cura.
Marko Brajovic: Curioso, né? Que até nas escolas o ensinamento, ou ainda colocam em muitos casos, a separação entre o ser humano e a natureza. Como se o ser humano fosse uma coisa superior. O ser humano fosse uma coisa separada dos outros animais. Consequentemente, isso traz, esta divisão, da cura ser um problema, né? No fim da linha, de você ter uma solução, industrialmente produzida, que é um serviço médico, que é um hospital. Que, aliás, tem uma estrutura que deriva do mundo do mundo militar, das campanhas militares. Esta origem da arquitetura e da logística, quando você entra num hospital, dá o ter RG, você recebe um bracelete, fica na fila e você fica, industrialmente, sendo levado de ponta a ponta, de forma passiva, de alguma forma. Agora, essa coisa, como nosso querido amigo fala, de terapeuta, próprio, né? Você ser seu próprio terapeuta, nesta cura de alguma forma. Mas, o trabalho é maior, eu vejo, é a reconexão da gente entender que somos parte de todo. Nós, como ser humano, somos parte de um ecossistema, que é parte da biosfera. Que é parte, nessa coisa escalável. E, também, para o micro, porque nós não somos separados. Nossos órgãos não são separados, as nossas doenças não estão separadas. Psicológica, física. Não tem divisão entre corpo e alma. Faz tudo parte, estamos integrados. Estamos com biólogo chama Walking Communities, são feitos por bilhões de bactérias, de outros microorganismos. E quem sou eu, né? Sou um indivíduo ou eu sou um dindivíduo, sou feito por infinidade, bilhões de outros organismos. Quando a gente começa a entender que a cura, de fato, a conexão com você mesmo, a conexão com toda tua integridade. Não estou falando de enfermidades específicas. Estou falando é de uma parte de preparação, constante, diária, né? De você mesmo com a tua natureza interna. Você em natureza. Você não precisa estar no contexto natural. Tem essa ideia romântica, vou para a natureza me conectar. Para quem medita, né amigo? É só fechar os olhos, você se conecta com esta a natureza. Você é natureza. A cidade foi produzida, também, pelo ser humano e, também, faz parte desta nova ecologia, né? Esse New Ecology. A garrafa pet faz parte da tua ecologia, tudo faz parte da ecologia. Não tem como se separar, não, aqui a natureza é perfeita e lá a gente está no contexto urbano e, agora, vou um pouco lá e, depois, eu volto para trabalhar. Acho que se a gente começa a entender que tudo está interconectado, que tudo é natureza, que nós somos natureza, essa, acho, que é a grande cura, né? E a nossa cura, quando, não temos como curar nós mesmo, se não curarmos o planeta. Se não curarmos as nossas relações com as outras espécies. E aí, temos o contexto no qual vivemos, como espécie, que é um laboratório de maior tecnologia e vemos no ponto o que podemos aprender, também, na natureza.
Marko Brajovic: Quais são as soluções que a natureza já oferece, porque é a maior tecnologia que existe. Não tem tecnologia mais avançada, ainda hoje, que a natureza. A biodiversidade é o laboratório de Best Practices, de grandes hits de design, em todas soluções. Design de impermeabilização de sistema, de organização, de empreendimento, de soluções de empreendimento, soluções contra o patógenas, há soluções de resiliência. Ou seja, tem soluções de tudo na natureza. E como podemos aprender com a natureza e aplicar isso no nosso cotidiano em todos os níveis? Acho que essa procura, também, de entender, estudar e entender a natureza e se conectar com a nossa natureza interna e se conectar com todas as outras espécies.
Lucas Mello: Parece que vários desses movimentos que a gente falou antes, fazem parte dessa cura também, né? Podem fazer parte dessa cura, se bem utilizados, bem trabalhados nessa questão que a gente falou no começo da nossa tribo, a tribo cura, é suporte, é, enfim, amparo. E aí, legal que você falou também da meditação.
Lucas Mello: Olhando para um aspecto otimista, tem muitas coisas acontecendo que podem ajudar a gente e eu acho que algumas dessas previsões aí, dessas tendências que a gente colocou, podem contribuir para a gente conseguir sair um pouco dessa patologia coletiva que a gente está vivendo.
Marko Brajovic: Patologia da separação com mesmos, patologia da separação com a natureza, patologia da separação com as revelações. Acho que a conexão consciente nessas esferas, acho que a grande cura, né?
Lucas Mello: É, essa noção ocidental do indivíduo, também, ela é impressionante. Quando eu fui para a Ásia, pela primeira vez, quando fui para a Tailândia e, enfim, viajei ali por aquela região do sudeste asiático, me chamou muito a atenção que eles não têm a palavra eu, né? Eles não usam essa expressão “eu”. Que é, talvez, a expressão que mais utiliza na vida ocidental. Falar do eu, eu fiz, é meu. Então, é legal a gente, também, aprender com algumas coisas dessa ancestralidade asiática, que tem muito conhecimento acumulado. E que o nosso leviano e juvenil mundo ocidental ainda está bem distante.
Lucas Mello: Eu queria aproveitar para te agradecer, por essa conversa, foi ótima. Senti como se estivesse dando uma das nossas caminhadas matinais e, finalmente, a gente conseguiu gravar uma dessas conversas.
Lucas Mello: E tomara que outras pessoas aí possam tirar algum proveito do que a gente conversou. Com certeza, eu tirei proveito e queria te agradecer demais.
Marko Brajovic: O agradecimento é meu e, também, todas as tuas perguntas me fazem refletir. Fico aprendendo em nossas conversas constantemente.
Marko Brajovic: Estamos em evolução. Isso é importante, porque acho que o novo normal é muito pouco, para qualquer pessoa consciente na capacidade da gente evoluir, nesse momento, mas pequenas grandes coisas.
Lucas Mello: Muitos desses movimentos não são novos e esse grupo de tendências formam o que a gente chama na Live de era pós digital. É uma época em que o digital se tornou tão onipresente e estrutural nas nossas vidas, que uma série de valores, oportunidades e patologias afloram de uma maneira inevitável nas nossas vidas. E a crise humanitária gerada pelo coronavírus potencializou grande parte desses comportamentos.
Se teve uma coisa que 2020 fez, foi nos deixar mais preparados e resilientes para enfrentar as dificuldades. Foi um ano trágico para muitas famílias, mas essa dor coletiva também transformou 2020 num ano de muito crescimento para muitas pessoas. Se a gente não deixar que a ilusão da volta à normalidade nos tire o ímpeto da inovação e da transformação, eu acredito que temos, sim, o potencial de sermos mais fortes e preparados para o futuro. Por mais incerto e imprevisível que ele seja. Tem uma frase do Jerry Seinfeld que diz: “a sobrevivência é o novo sucesso”. Para todas as pessoas negócios e organizações que conseguiram atravessar essa tempestade, parabéns.
Lucas Mello: Desejo a todos um 2021 de muita força, alegria e criatividade. Esse foi o último episódio dessa temporada do 22 mil pés. Muito obrigado. Estaremos de volta na terceira semana de janeiro. Até lá.